A história tem seu olhar em Hamilton
Talita Vaconcelos
O musical Hamilton estreado em 2015 no circuito off-Broadway revolucionou a cultura do entretenimento americana ao apresentar uma interpretação atual da independência das 13 colônias, a partir do “pai fundador” Alexander Hamilton. Nele a mistura inovadora dos ritmos rap, pop, R&B e jazz junto ao elenco multiétnico se choca com a história conservadora dos personagens. O contato dos atores com as redes virtuais como Twitter transformaram o musical em um fenômeno que alcançou a Broadway e hoje tem sua versão gravada para o cinema disponível na Disney+.
A força política de Hamilton já era grande antes mesmo de seu lançamento, quando em 2009 Lin-Manuel Miranda, criador do musical, apresentou-se para o então presidente Barack Obama um hip-hop sobre Alexander Hamilton. O que era uma música sobre o político do século XVII transformou-se em um musical completo que busca evidenciar os ideais norte-americanos como: determinação, esforço e inclusão, abordando temas sobre liberdade, democracia, revolução, tendo uma exatidão aos fatos históricos, que chega a ser impressionante, mas deixando a desejar no tratamento da escravidão, pois ao tratarem sobre assuntos tão sérios, eles trazem também, a contradição, afinal, são donos de pessoas escravizadas, lutando por igualdade e independência.
Ainda assim, em sincronia com os pensamentos de Obama, Miranda explora essa disparidade e visão íntegra dos Estados Unidos não como eles foram, mas como poderiam e deveriam ser, aproximando a imagem do ontem, a de hoje, onde vemos uma nação que tem passado por reconstruções.
Em 2015 quando o musical foi lançado o clima político norte-americano já não era o mesmo que em 2009, assim como o peso dos assuntos tratados no musical. A força das músicas cantadas em Hamilton são ressignificadas a partir dos movimentos políticos, se transformando em mensagens de protesto, e isso é perceptível ao analisar os acontecimentos dos últimos anos. Durante o governo Trump com a construção do muro entre Estados Unidos e México e o discurso xenofóbico do ex-presidente, o fato de Alexander Hamilton, figura excepcional na história américa, ser um imigrante caribenho teve sua relevância aumentada assim como a fala do musical “Immigrants, we get the job done”. Isso porque, em 2009, não havia Trump, mas a partir do crescimento de políticas anti-imigração, a frase se tornou um ato político afrontoso, onde os imigrantes são exaltados, e não violados.
Na saída de Barack Obama da presidência a música “One Last Time” também ganhou um valor especial pois trata-se da partida de George Washington do mesmo cargo. E frases como "a História está voltada para você" (da música "History Has Its Eyes On You") ou "Amanhã haverá mais de nós" (de "The Story of Tonight") aparecem em cartazes de todo o Estado, dando significado às manifestações contra o então, recém-empossado, presidente Donald Trump.
Os assuntos políticos tratados no musical não foram fechados nas 4 paredes da Broadway e o elenco sempre se colocou como porta-voz político americano. Em 2016 eles também se envolveram em uma polêmica com a Casa Branca por criticar o vice-presidente Mike Pence após uma apresentação.
Em 2020 não foi diferente: após o assassinato de George Floyd por policiais brancos, uma onda de protestos foi despertada. Artistas de diversas partes do mundo se posicionaram em repúdio ao racismo sistêmico do país, outros deram vozes a pessoas negras por meio de suas redes sociais, para que pudessem abordar o tema com propriedade e tendo uma grande visibilidade. Mais uma vez, percebemos a obra presente, pois além do posicionamento de todo o elenco, a citação de que “não é um momento, é um movimento" (da letra de "My Shot") se torna um hino no movimento.
A revolução de Hamilton é uma revolução do indivíduo que se percebe existente em uma sociedade, nos transmitindo de forma contagiante, o lembrete de que somos seres políticos, e que a mesma está enraizada no ser humano e que desperta nosso desejo de mudança. Com isso, o elenco de Hamilton se juntou à campanha de Joe Biden para a presidência, influenciando as pessoas sobre a importância e necessidade de votar, e de realizar o ato de maneira consciente, para que essa possibilidade pudesse se tornar a realidade da nação. Ao apoiar a campanha do democrata, os artistas participaram de um debate para arrecadar fundos para o candidato.



Gostei da discussão
ResponderEliminar